Conquistas atuais: o impacto do tratamento com células-tronco na recuperação de tetraplegia

Lesões na medula espinhal afetam milhões de pessoas globalmente, com tratamentos limitados a gerenciar sintomas. Contudo, um estudo clínico da Clínica Mayo mostra resultados animadores usando células-tronco mesenquimais derivadas de tecido adiposo. Este tratamento inovador, administrado intratecalmente, demonstrou segurança e eficácia, melhorando funções motoras e sensoriais em pacientes como Chris Barr, que notou ganhos significativos na mobilidade anos após o tratamento. Este avanço ilustra o potencial transformador da medicina regenerativa.

Lesões na medula espinhal (LME) representam um grave problema de saúde que afeta milhares de pessoas ao redor do mundo anualmente. Globalmente, estima-se que aproximadamente 15,4 milhões de pessoas vivam com LME e cerca de 250.000 a 500.000 novos casos ocorrem anualmente. A maioria dos casos ocorre em indivíduos com idades entre 15 e 29 anos, embora a idade média esteja aumentando devido ao envelhecimento da população global. Tais lesões geralmente ocorrem devido a acidentes de trânsito, quedas, práticas esportivas ou violência. 

Dependendo do local e da severidade da lesão, os efeitos podem variar desde perda de sensibilidade até paralisia total. Até o momento, não há um tratamento que seja 100% efetivo, os tratamentos se limitam somente a gerenciamento dos sintomas e reabilitação física, ou seja, a recuperação de funções é muito custosa e demandante. Por isso, muitos cientistas têm tentado abordagens mais inovadoras, como por exemplo a terapia com células-tronco. Esta área da medicina regenerativa está explorando como estas células podem promover a reparação da medula espinhal, potencialmente restaurando funções e melhorando a qualidade de vida das pessoas afetadas.

Neste contexto, a história de Chris Barr destaca um avanço promissor. Ele era um surfista que sofreu um acidente devastador, em que fraturou seu pescoço, e passou a apresentar um diagnóstico de tetraplegia – condição que geralmente limita significativamente a mobilidade física e a independência do pescoço para baixo. 

No entanto, sua inclusão em um estudo clínico de células-tronco mesenquimais (CTMs) derivadas de tecido adiposo, realizado pela Clínica Mayo, nos Estados Unidos, abriu uma nova porta de esperança. Essas células, derivadas do tecido adiposo, são consideradas opções atraentes devido à sua disponibilidade, facilidade de acesso, multipotência e capacidade angiogênica e neuro-regenerativa. Ensaios pré-clínicos em modelos animais com lesão medular mostraram evidências de que elas podem regular a resposta inflamatória e promover um ambiente regenerativo, correlacionando-se com resultados clínicos promissores.

O tratamento envolveu a injeção de 100 milhões de CTMs autólogas, ou seja, obtidas da gordura abdominal dos pacientes. A injeção realizada era  intratecal – uma técnica que administra células diretamente no espaço ao redor da medula espinhal, diretamente no líquido céfalo-raquidiano (líquor).

O estudo, que buscava avaliar a segurança das CTMs – por meio de avaliações relacionadas à natureza e frequência dos eventos adversos – incluiu dez pacientes com lesões similares, ou seja, com grau A ou B da Escala American Spinal Injury Association Impairment Scale (AIS) no momento da lesão. Os desfechos secundários do estudo incluíram mudanças nos escores sensoriais e motores, imagens, marcadores do líquido cefalorraquidiano e potenciais evocados somatossensoriais. 

Esses pacientes foram acompanhados por 96 semanas e o estudo mostrou resultados bastante animadores. As CTMs não apenas se mostraram seguras — com a maioria dos eventos adversos sendo leves e gerenciáveis (como dor de cabeça e dor musculoesquelética) — mas também eficazes em promover a recuperação neurológica. Barr e outros seis pacientes apresentaram melhorias nas classificações da AIS, indicando recuperação de algumas funções motoras e sensoriais. Mais de cinco anos após passar pela terapia, Barr disse que continua ganhando mais independência e se tornando mais rápido ao caminhar.

Esses resultados são encorajadores mas devem ser interpretados com cautela devido às limitações intrínsecas dos ensaios clínicos de Fase I. Assim, mais pesquisas são necessárias para explorar plenamente o potencial das CTMs na recuperação de lesões na medula espinhal. Isso pode incluir estudos de Fase II e III com um número maior de participantes para validar os achados iniciais.

A aplicação de CTMs derivadas de tecido adiposo em lesões da medula espinhal ilustra o potencial da medicina regenerativa para oferecer melhorias significativas em condições anteriormente vistas como irreversíveis. Enquanto desafios e questões permanecem, os resultados deste estudo de Fase I são um marco promissor na busca por terapias eficazes para lesões da medula espinhal e outras condições neurológicas.

Referências:

Artigo comentando o estudo: Chris Barr: Paralyzed man who can walk again shows potential benefit of stem cell therapy – ABC7 Chicago 

Artigo da Mayo Clinic com vídeo de Chris Barr após tratamento: New Hope for Regaining His Old Life After Being Paralyzed 

Artigo publicado na revista Nature: Intrathecal delivery of adipose-derived mesenchymal stem cells in traumatic spinal cord injury: Phase I trial | Nature Communications 

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